26/01/2016

Intervenção sobre a Proposta nº 777/2015 - 5º Relatório de Monitorização do Processo da Reforma Administrativa de Lisboa, proferida em 26 de Janeiro de 2016


 
A AML recebia trimestralmente os anteriores 4 Relatórios apresentados pelo Grupo de Acompanhamento e Monitorização da Reforma Administrativa de Lisboa, tendo-os comentado em 15 de Julho e 18 de Novembro de 2014 e em 10 de Março e 9 de Junho de 2015. Desde então, a sua periodicidade passou a ser semestral, pelo que analisamos hoje o 5º Relatório para o período compreendido entre Abril e Setembro de 2015.
Este Relatório sintetiza já os conteúdos que o Grupo considera expectáveis para o semestre seguinte, incluindo futuros instrumentos regulamentares de base integradora, uma análise ao desenvolvimento das acções levadas a cabo pelas Juntas e do tipo de colaboração a estabelecer entre estas e a CML, e ainda a constituição de um painel de indicadores quantitativos da futura governação urbana, e a promessa de dois tipos de inquéritos, um aos agentes da cidade nas áreas sociais, económicas, educativas, culturais, entre outras, talvez no decorrer de 2016, e a realização de um inquérito específico aos munícipes, embora só a médio prazo.
No âmbito dos recursos financeiros, o relatório refere (citamos da p. 19) a “reavaliação das receitas e dos custos associados às competências transferidas”, as inevitáveis “correcções financeiras das assimetrias”, mas também os necessários “acertos de valores decorrentes das alterações legais” e que estavam programadas para o final do ano transacto. Porém, olhando para o quadro 1 da p. 20, não sabemos em que medida terão os valores apresentados recebido confirmação e anuência por parte das Juntas e se essa transferência já terá ou não sido processada. Também não somos esclarecidos se ficam de vez saldadas as correcções financeiras com as Juntas. Como desconhecemos se terão sido processados, até ao final de 2015, os previstos acertos de valores, provavelmente teremos de esperar mais 6 meses para, evitando recorrer a qual bola de cristal, divisar, algures no futuro 6º relatório, clarificar a execução desta disposição legal.
Quanto aos novos protocolos celebrados entre a CML e as Juntas, passámos a saber que, decorrido ano e meio da reforma administrativa, entre de Março de 2014 e Setembro de 2015, terão sido aprovados cerca de sete dezenas de novos protocolos, que terão totalizado um valor aproximado de 4,93 milhões de euros.
Contudo, o relatório aponta para discrepâncias no caso de Juntas com saldo orçamental superavitário, devidamente reconhecido no Auto de Transferência de Competências. Por outras palavras, afinal a globalidade das verbas referidas nos respectivos protocolos não correspondem a transferências financeiras directas por parte da CML, visto que parte relevante das verbas previstas estará a ser assumida financeiramente pelas próprias Juntas. E este, sr. presidente, é um ponto que merece uma clarificação mais rigorosa por parte da CML.
No que se refere aos funcionários das 24 Juntas de Freguesia, e como já se constatara pelo levantamento desenvolvido pelo GAMRAL em final de Março de 2015, registava-se um total de 2.971 trabalhadores, aproximadamente um terço do total autárquico da cidade. Só que, destes trabalhadores das Juntas, apenas 1.552 eram trabalhadores do quadro, ou seja, apenas 52%, havendo 1.264 contratados por prestação de serviços e em regime de tempo inteiro, e 155 contratados por prestação de serviços em trabalho parcial. E, como se expressa no quadro da p. 25, para além dos abruptos cortes salariais introduzidos pelo anterior Governo, foram ainda reportados problemas respeitantes ao aumento de horas de trabalho semanal e a exigências de trabalho extraordinário.
Neste contexto, e parecendo-nos indispensável encontrar-se uma solução bem mais satisfatória para os trabalhadores, questionamos como se irá procurar proceder a uma urgente e justa actualização dos seus vínculos públicos.
Apresenta-se também como indesmentível a existência de insuficiências, desde recursos humanos nas áreas do suporte administrativo, a técnicos superiores e mesmo de dirigentes, resultantes de, como “Os Verdes” têm vindo a alertar, uma óbvia falta de preparação neste precipitado processo de transferência de competências.
Já quanto ao sistema de funcionamento, instalações e sistemas de informação das Juntas, é reconhecido que o aumento substancial das suas competências e recursos implicou mudanças fundamentais nas suas estruturas institucionais, organizacionais e culturais. Contudo, estes novos desafios não vieram acompanhados dos meios e recursos indispensáveis, pelo que se tem recorrido a contratações externas para o controlo de gestão, o apoio jurídico, o suporte administrativo, a gestão dos recursos humanos e mesmo no atendimento ao munícipe.
Por exemplo, para o caso dos sistemas de informação, mantém-se insuficiências nos processos de licenciamento, à gestão das contra-ordenações ou no cadastro de ocorrências, ao contrário da CML que tem acesso a uma informação integrada. Tal resulta da não interoperabilidade entre sistemas, pois algumas Juntas têm desenvolvido aplicações próprias de suporte às suas competências, correndo-se o risco de uso de aplicações informáticas ‘fechadas’ na comunicação com os sistemas da CML e as outras Juntas.
Outra das incongruências reporta-se à transição dos contratos onde, ao contrário do que vem expresso na p. 57 do relatório, houve Freguesias que, recentemente, foram ‘apanhadas de surpresa’ com a apresentação de facturas por pagar, nas quais os períodos correspondiam a antigos consumos e alugueres da responsabilidade da CML. Como tenciona agora a CML solucionar estas situações?
Na limpeza urbana (p. 72), a própria monitorização voltou também a apontar “importantes dificuldades associadas ao envelhecimento e a avarias nos equipamentos mecânicos e veículos” cedidos com deficiências técnicas, bem como nos espaços verdes (p. 92) constrangimentos vários “com dificuldades relevantes” das Juntas, em particular da “gestão do arvoredo de alinhamento”, mas, mais grave ainda, com a “contratação de serviços” externos, o que representa uma real privatização de serviços.
A excepção que confirma a regra de todo este panorama negativo reporta-se aos equipamentos escolares (p. 129), onde, finalmente, terá sido a CML a responsabilizar-se pelos custos da realização das obras em algumas escolas.
Pelo contrário, nos equipamentos desportivos (e citamos a p. 141) mantém-se “situações de desentendimento entre as Juntas e a CML quanto às responsabilidades de cada entidade no referente a questões de manutenção e sobretudo nas situações de necessidade de realização de obras ou investimentos de carácter mais estruturante”. Neste particular, destacam-se as piscinas, onde algumas Juntas aprovaram tabelas de preços com novos critérios de isenções, tendo mesmo aumentado as tarifas de forma relevante ou a diferenciá-las, através de descontos, entre fregueses e não fregueses. Estas situações “têm sido objecto de diversas reclamações por parte dos munícipes junto da CML e dessas Juntas”, por não terem sido adoptados, de forma igual, os preços estabelecidos na “Tabela de Taxas, Preços e Outras Receitas Municipais”.
Os Verdes” não podem deixar de discordar por não ser seguido o princípio de ‘para oferta de serviço igual, taxas iguais para qualquer munícipe’. Daí a pergunta: vai ou não ser efectivamente reposta essa uniformização de acordo com a Tabela de Taxas?
O Grupo de Acompanhamento constata (citamos p. 184 e ss) um panorama desigual entre Juntas, onde persistem várias “importantes lacunas” e linhas de apoio “desajustadas” que originam uma “fraca articulação” entre as Juntas e a CML, bem como o desentendimento “em torno das tarifas e tabelas de preços em vigor”, a não clarificação sobre o que é ou não estruturante e sobre competências próprias no licenciamento.
Exige-se, por isso, a revisão do Estatuto dos Eleitos Locais, uma efectiva coordenação política, urgentes instrumentos regulamentares, estratégias partilhadas e sistemas de informação comuns, com uma articulação mais estreita.
Finalmente, se é certo que ninguém poderia esperar ou exigir um desenlace sem percalços nesse processo, não havia necessidade para toda esta impreparação e pressa política da CML, que abandonou nos braços das Juntas inúmeras situações por resolver e disparidades, independentemente de se viver e trabalhar na mesma cidade - Lisboa. Estes sobressaltos implicaram dúvidas nos cidadãos, que deveriam ter sido evitadas e que não podem ser medidas e avaliadas sem um inquérito específico aos munícipes.
As fragilidades sentidas neste processo denotam, à colação, a precipitação política da CML na condução de uma reforma que não foi bem ponderada e que vai sendo feita com muita navegação à vista e uma abundante pitada de percalços e ‘depois logo se vê’.


J. L. Sobreda Antunes,
Grupo Municipal de “Os Verdes

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