19/07/2016

Intervenção sobre a Proposta nº 273/2016 - 6º relatório de monitorização do processo da Reforma Administrativa de Lisboa, na Assembleia Municipal de Lisboa de 19 de Julho de 2016


 
O 6º relatório, que hoje analisamos, é o 2º a ter uma periodicidade semestral. Cobrindo o período até 31 de Março de 2016, ou seja, dois anos decorridos após a assinatura dos autos de transferência de competências entre a CML e as 24 Juntas de Freguesia, seria expectável que o Grupo de monitorização do processo da reforma administrativa de Lisboa apresentasse um diversificado leque de medidas correctivas, já introduzidas pelo executivo em todo este processo. Será de facto assim ou será que subsistem grande parte dos impasses já constados nos anteriores 5 relatórios?
O Grupo constata (na p. 7) que as Juntas têm vindo a “desenvolver posturas e soluções de carácter diferenciador”, traçando um cenário que, como expresso no actual relatório, não é o “desejado para uma plena capacitação da acção pública de proximidade na cidade”. E explicam as suas causas.
Tal deve-se basicamente, entre outras razões, à ausência de estruturas e ferramentas para serem uniformemente utilizadas por todas as instituições de governo da cidade, num quadro de acção que, admitindo autonomia, fosse simultânea e institucionalmente integrada, situação, aliás, que se vem arrastando ao longo destes 2 anos de reforma administrativa. Deve-se, também, à inércia da CML em se adaptar devidamente a uma nova realidade e a intervenções de maior proximidade. Deve-se, igualmente, ao incipiente reforço, adaptação e formação de recursos humanos e equipas técnicas. E deve-se, em suma, à ocorrência de duplicações de tarefas entre as autarquias e à não atempada capacitação ou transferência para as Juntas de funções específicas (p. 7 e 8).
O Grupo de monitorização sustenta que bem tem procurado seguir as inúmeras recomendações exaradas pelas 1ª e 5ª Comissões da AML, e aqui aprovadas por unanimidade, mas, como será óbvio, a responsabilidade pela sua não aplicação ultrapassa as suas incumbências, pois essa obrigação é exclusiva do executivo. Senão vejamos (p. 10 a 16).
Quem já há muito tempo deveria ter clarificado quais as fronteiras entre as obras de natureza estruturante e não estruturante? Quem é responsável pela não elaboração de instrumentos de base reguladora essenciais para o normal funcionamento da cidade? Quem é responsável pela substituição dos materiais e equipamentos transferidos que se revelaram defeituosos ou obsoletos? Quem é responsável pela não definição de metodologias concretas de actuação, em áreas cujas obrigações se encontram ainda difusas (desde a limpeza de zonas pedonais, ao desentupimento dos sistemas de drenagem, à definição de áreas expectantes ou mesmo nos apoios a eventos locais)? A quem competiria atempadamente definir o funcionamento dos processos de licenciamento, designadamente, de ocupações de espaço público, da publicidade, das licenças especiais de ruído ou de venda ambulante? Porque refere o Grupo que se mantêm relevantes insuficiências, bem como riscos de dispersão, no uso de algumas aplicações comuns (como GESLIS e GOPI), bem como no acesso a determinados cadastros? Decorridos 2 anos, porque não foi ainda garantida uma utilização universal de sistemas de informação fiáveis, viáveis e completamente integrados para uso dos diferentes actores na cidade? Por culpa dos executivos das Juntas? Claro que não.
Mas não só, pois deparamo-nos ainda, neste 6º relatório, com a descrição de outro conjunto de insuficiências e desfasamentos. Por exemplo:
Mantêm-se ou não disparidades a nível do número de recursos humanos disponíveis, bem como da sua qualificação? (p. 62) Confirma-se o facto de apenas 52% dos trabalhadores das Juntas serem funcionários do quadro e os restantes serem contratados em prestação de serviços? (p. 31) Confirmam-se assimetrias entre as diferentes Juntas, que indiciam que nem todas se encontram a usar os sistemas disponibilizados em todas as suas valências? (p. 62) Confirma-se ou não a persistência de sistemas de informação a vigorar de forma não integrada? (p. 53) Confirmam-se as denunciadas dificuldades associadas ao envelhecimento e a avarias nos equipamentos mecânicos e veículos recebidos da CML? (p. 83) Confirma-se que o desgaste da frota transferida e a sua elevada taxa de inoperacionalidade são um constrangimento com reflexo na prestação do serviço de limpeza pública prestado pelas Juntas? (p. 91)
E poderíamos continuar a comentar outras situações particulares (p. 92 e 93), como o não alinhamento de estratégias, o ‘outsourcing’ em vez da internalização de funções, o desenquadramento dos regulamentos do espaço público em que a governação é partilhada, a ausência de regulamentos globais e critérios de uniformização na acção (p. 100), cadastros parcialmente desactualizados (p. 101), a indevida dotação de meios humanos e técnicos, o não reforço de equipamentos para o ambiente urbano e gestão da limpeza (p. 117), a não clarificação de competências na área do arvoredo de alinhamento ou em caldeira e análise da sua fitossanidade, o estabelecimento de regulamentos conjuntos para áreas em que a governação é partilhada (p. 118), nos equipamentos desportivos, eventuais desentendimento entre as Juntas e a CML quanto às responsabilidades na sua manutenção e, no caso das piscinas, sobre a realização de obras ou investimentos de carácter mais estruturante, subsistindo a questão das tabelas de preços e critérios diferenciados de descontos ou de isenções, tendo em alguns casos as tarifas aumentado de forma relevante (p. 135), ou ainda vários parques infantis em mau estado de conservação, embora a CML se tivesse comprometido, em muitos dos casos, a realizar as intervenções necessárias (p. 145).
A constatação mais espantosa é, no essencial, como o Grupo enuncia (p. 92), que a sua observação não difere substancialmente da análise desenvolvida há 6 meses atrás. Então, de quem é a responsabilidade para toda esta entropia?
Após todos estes generalistas considerandos, as questões que “Os Verdes” colocam são: porque só agora se lembra a CML de elaborar instrumentos regulamentares e de estabelecer outras formas de normalização técnica e administrativa a aplicar ao conjunto das instituições autárquicas da cidade? Porque aguardou pelas petições de munícipes e queixas de algumas Juntas para ‘pôr trancas à porta’?
As possíveis respostas têm “Os Verdes” dado na análise aos anteriores 5 relatórios. Serão a impreparação técnica da CML, que abandonou nos braços das Juntas disparidades várias e inúmeras situações por resolver? Ou as fragilidades na condução de uma reforma que não foi bem ponderada e que vai sendo feita com muita navegação à vista? Ou um vacilante processo de transferência de competências, fruto da precipitação política da CML, o que não tem sido bom conselheiro a nível de planeamento?
Quanto às panegíricas súmulas dos relatórios, apesar de assumirem uma atitude francamente apologética sobre o ‘estado da arte’ da reforma em curso, não deixam de desencobrir o véu das fragilidades sentidas ao longo deste processo.
Em conclusão, todos estes sobressaltos implicaram dúvidas nos cidadãos, que não podem ser medidas e avaliadas sem um inquérito específico aos munícipes. Pergunta-se, finalmente, porque continua o executivo a adiar a autorização para o Grupo proceder à auscultação dos munícipes (p. 16)? Porque não é esta monitorização preparada por uma equipa multidisciplinar, mas independente? São opções do executivo para as quais, desde o início do processo, “Os Verdes” nunca encontraram uma resposta coerente e satisfatória.

J. L. Sobreda Antunes
Grupo Municipal de “Os Verdes

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