19/06/2012

Plano Director Municipal de Lisboa - Intervenção da Deputada Municipal do PEV, Cláudia Madeira, na sessão da Assembleia Municipal de 19 de Junho


A proposta, agora em discussão, tem como objecto a revisão do Plano Director Municipal de Lisboa. O PDM reveste-se de extrema importância para o desenvolvimento e ordenamento da cidade de Lisboa, assente nos mais diversos parâmetros.
O PDM aprovado em 1994, com cerca de 18 anos de vigência, foi o instrumento central de planeamento e gestão urbanística da cidade, mas como todos sabemos, várias vezes ultrapassado nas suas linhas orientadoras, por consecutivas suspensões, fruto de opções políticas sectoriais, que prejudicaram a cidade e o seu devido ordenamento territorial.
Sucessivos executivos teimaram em não entender o PDM como um instrumento que deveria atender à globalidade dos interesses públicos de ordem paisagística, histórica, cultural e de humanização do território, e como tal, os resultados negativos destas opções políticas, são hoje visíveis na cidade de Lisboa.
Sendo esta proposta uma revisão, o novo PDM deveria contemplar em si, dentro de uma correcta metodologia, uma análise do PDM de 1994.
Denotamos por isso, a falta de um diagnóstico da aplicação do PDM em vigor, que não foi incluída na proposta que hoje discutimos, e que seria imprescindível para que os erros do passado não se voltassem a cometer.
Era importante termos acesso a uma análise da sua aplicação e concretização, quais os aspectos positivos e negativos, e quais as situações verificadas que pudessem justificar que o PDM agora em discussão seja este e não outro.
Apontamos de positivo e resultante da acção de planeamento no período de vigência do PDM em vigor, a realização da Expo 98, que resultou na reconversão da zona oriental da cidade, o facto de o PDM incorporar componentes ambientais urbanas, assim como relativamente ao património com a elaboração do Inventário Municipal do Património e da Carta Municipal do Património, tendo vindo ainda a materializar os objectivos estratégicos definidos no Plano Estratégico de Lisboa de 1992, entre outras questões.
Como aspecto negativo, e principalmente na última década, queremos lembrar a desconsideração quase total por uma ética e cultura de planeamento e de ordenamento territorial da cidade, que o actual PDM contém, e um uso e abuso excessivo de processos de suspensão e de alteração ao Plano, que na opinião de «Os Verdes» têm prejudicado um desenvolvimento planeado, ordenado e harmonioso da cidade de Lisboa.
Há algumas questões que não podem deixar de ser referidas, como o facto desta revisão se ter iniciado sem haver um Plano Estratégico, pois apenas em 2009 se começou a elaborar a Carta Estratégica de Lisboa 2010-2024.
Esta proposta foi apresentada, retirada, perdeu-se-lhe o rasto algures na Câmara Municipal e, até hoje, continuamos à espera.
Assim, e contrariando o que aconteceu com o PDM hoje em vigor, esta proposta não é precedida de um plano estratégico.
Isto leva-nos, obrigatoriamente, para a forma como a CML tem insistido num modelo de planeamento baseado num rol interminável de Planos de Pormenor e de Planos de Urbanização que têm vindo a retalhar a cidade de Lisboa, sem ter uma visão integrada e global para a cidade no seu todo.
Também a nível do prazo para a discussão pública, é importante referir o tempo limitado para essa discussão, tendo em conta a importância e complexidade deste documento.
Entrando no conteúdo da proposta de revisão do PDM, são definidas 4 prioridades estratégias, 7 objectivos estratégicos, assim como 7 políticas urbanísticas/territoriais. De entre as prioridades estratégicas é mais ou menos consensual a importância de Regenerar a Cidade Consolidada e de Promover a Qualificação Urbana, daí que tenha sido estabelecido como um dos objectivos estratégicos a Reabilitação Urbana que permita um melhor aproveitamento do património edificado e das infra-estruturas já existentes na cidade de Lisboa.
Para atingir este objectivo, o PDM prevê como principais instrumentos os incentivos fiscais, através da diminuição das taxas urbanísticas, e o sistema de incentivos a operações urbanísticas de interesse municipal através da atribuição de créditos de edificabilidade ou construção, definidos no artigo 84º do regulamento do PDM, que, no fundo, são uma forma específica de moeda, neste caso uma moeda em m2, em que, quando o proprietário ou titular das operações urbanísticas cumprir determinados pressupostos, são atribuídos direitos acrescidos de edificabilidade ou construção em metros quadrados.
Esses créditos de edificabilidade ou construção podem ser transaccionáveis a terceiros, ou seja num mercado de moeda de edificabilidade, favorecendo, assim, a criação de um mercado especulativo que tende a favorecer os grandes promotores imobiliários.   
Este mecanismo de créditos de edificabilidade ou construção não resolve os problemas das AUGI – Áreas Urbanas de Génese Ilegal, não resolve os problemas da reabilitação urbana nos bairros sociais e em alguns dos bairros históricos mais carenciados, nem resolve o problema dos antigos núcleos rurais ou operários que ainda subsistem na cidade de Lisboa.
A proposta de PDM prevê, para além das Unidades Operativas de Planeamento e Gestão, as Unidades de Execução, que constituem o instrumento preferencial de execução do Plano, e que permitem a realização de operações urbanísticas em conjunto por opção da CML, com escala adequada, cabendo exclusivamente à CML a sua delimitação.
«Os Verdes» entendem que a Assembleia Municipal deverá também apreciar e deliberar sobre as propostas de delimitação das Unidades de Execução apresentadas pela CML.
Destacamos ainda 6 aspectos manifestamente negativos nesta proposta de Revisão do PDM de Lisboa:
Em primeiro lugar, a impermeabilização dos solos na cidade de Lisboa prolifera na zona ribeirinha da cidade com a construção de edifícios com caves de vários pisos subterrâneos, destinados a parques de estacionamento, como por exemplo no Aterro da Boavista. 
Por outro lado, uma cobertura em laje de betão revestida de espécies herbário-arbustivas nunca cumprirá a função na ecologia urbana de um logradouro ou jardim, pelo que a fórmula de cálculo do conceito de “Superfície Vegetal Ponderada”, valoriza de forma excessiva as superfícies vegetais aplicadas sobre as lajes como contributo para a criação daquelas áreas verdes.
Segundo ponto, o Parque Florestal de Monsanto, apesar de estar sujeito ao regime florestal total, tem vindo a ser substancialmente reduzido para urbanizações e equipamentos, com fortes impactos negativos ao nível do abate de árvores, da impermeabilização do solo, do aumento exponencial do trânsito e do alargamento dos caminhos.
Terceiro ponto, esta proposta não acautela devidamente a prevenção e mitigação de riscos naturais e antrópicos no PDM, nomeadamente as ilhas de calor e as inundações, pois permite a construção em cave em zonas em que a vulnerabilidade a inundações é qualificada de “muito elevada”, e não identifica as ilhas de calor na cidade e define medidas mitigadoras dos seus efeitos nas áreas identificadas. Assim, a autarquia deverá avançar com a implementação de medidas de alerta e mitigação de riscos relacionados com maremotos e sismos.
Quarto ponto, em relação à rede de transportes públicos colectivos, nas plantas de qualificação do espaço urbano e de acessibilidades e transportes não se encontram assinaladas a rede ferroviária existente e prevista, a rede de metropolitano existente e prevista, a rede ciclável existente e prevista e a rede de eléctricos existente e prevista e o PDM não prevê a possibilidade de utilizar materiais com maior grau de permeabilização no pavimento destinado às ciclovias e nas áreas de estacionamento à superfície.
Para reduzir o fluxo resultante da circulação de transporte privado e individual na cidade de Lisboa era fundamental a criação de parques de estacionamento dissuasores junto aos concelhos limítrofes de Lisboa, em articulação com a criação de interfaces de transportes públicos colectivos. Não estão previstas no PDM medidas que respondam às carências de estacionamento para residentes nalgumas áreas da cidade, pelo que não se compreende a possibilidade, prevista no regulamento do PDM, de redução do número de lugares de estacionamento a ceder ao Município como contrapartida de operações de promoção imobiliária.
Em quinto lugar, a constatação de que, com excepção da Carta de Equipamentos Desportivos, todas as restantes cartas de equipamentos se encontram desactualizadas.
As diversas Cartas de Equipamentos, e não só a Carta Educativa, deveriam integrar o conteúdo documental do PDM pois os equipamentos colectivos devem ser encarados como dinamizadores da economia e da vivência local onde se encontram e não como condicionantes fortes do PDM.
A autarquia optou por elaborar programas sectoriais, como por exemplo o Programa de Bibliotecas XXI ou o Programa de Creches, em detrimento da elaboração de uma Carta de Equipamentos Culturais e de uma Carta de Equipamentos Sociais que permitiriam dar uma visão mais global e integrada às necessidades de resposta coordenada nestes domínios, procurando tirar partido de eventuais sinergias de recursos e esforços entre os diversos agentes de desenvolvimento local.
Por fim, o sexto ponto relacionado com a delapidação e alienação do património edificado da cidade de Lisboa, como por exemplo dos Hospitais Civis de Lisboa, de grande valor patrimonial, cultural, histórico, arquitectónico e artístico. O PDM é omisso no reconhecimento do valor patrimonial do mobiliário urbano histórico e de época, como os candeeiros de iluminação pública, bancos de jardim ou bebedouros, assim como ignora a valorização e a salvaguarda do património de azulejaria de fachada e de interior que constitui um factor identitário nacional de expressão cultural e artística de excelência.  
Em Lisboa, nas últimas décadas, têm sido constantes as intervenções no subsolo com achados portuários e náuticos.
Devido à elevada sensibilidade arqueológica e ao potencial arqueológico na zona ribeirinha, o regulamento do PDM devia prever medidas de acompanhamento arqueológico para todas as operações urbanísticas com fortes intervenções no subsolo nesta área, com vista a salvaguardar todos os “vestígios da época de ouro de Portugal”.
Em síntese, esta proposta de revisão representa uma oportunidade perdida e subaproveitada, não se orientando para as necessidades e vivências das pessoas, mas antes para a promoção da especulação imobiliária. Este novo PDM deveria ir ao encontro das preocupações e da resolução dos problemas manifestados ao longo dos últimos anos, mas é antes um instrumento de gestão do território prejudicial para a cidade.
Para «Os Verdes», este PDM não resolve os problemas, não vem colmatar as lacunas do PDM de 1994 e não é, seguramente, o instrumento de planeamento e gestão urbana que a cidade está a precisar.

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