A proposta,
agora em discussão, tem como objecto a revisão do Plano Director Municipal de
Lisboa. O PDM reveste-se de extrema importância para o desenvolvimento e
ordenamento da cidade de Lisboa, assente nos mais diversos parâmetros.
O PDM
aprovado em 1994, com cerca de 18 anos de vigência, foi o instrumento central
de planeamento e gestão urbanística da cidade, mas como todos sabemos, várias
vezes ultrapassado nas suas linhas orientadoras, por consecutivas suspensões,
fruto de opções políticas sectoriais, que prejudicaram a cidade e o seu devido
ordenamento territorial.
Sucessivos
executivos teimaram em não entender o PDM como um instrumento que deveria
atender à globalidade dos interesses públicos de ordem paisagística, histórica,
cultural e de humanização do território, e como tal, os resultados negativos
destas opções políticas, são hoje visíveis na cidade de Lisboa.
Sendo
esta proposta uma revisão, o novo PDM deveria contemplar em si, dentro de uma
correcta metodologia, uma análise do PDM de 1994.
Denotamos
por isso, a falta de um diagnóstico da aplicação do PDM em vigor, que não foi
incluída na proposta que hoje discutimos, e que seria imprescindível para que
os erros do passado não se voltassem a cometer.
Era
importante termos acesso a uma análise da sua aplicação e concretização, quais
os aspectos positivos e negativos, e quais as situações verificadas que
pudessem justificar que o PDM agora em discussão seja este e não outro.
Apontamos
de positivo e resultante da acção de planeamento no período de vigência do PDM
em vigor, a realização da Expo 98, que resultou na reconversão da zona oriental
da cidade, o facto de o PDM incorporar componentes ambientais urbanas, assim
como relativamente ao património com a elaboração do Inventário Municipal do
Património e da Carta Municipal do Património, tendo vindo ainda a materializar
os objectivos estratégicos definidos no Plano Estratégico de Lisboa de 1992,
entre outras questões.
Como
aspecto negativo, e principalmente na última década, queremos lembrar a
desconsideração quase total por uma ética e cultura de planeamento e de
ordenamento territorial da cidade, que o actual PDM contém, e um uso e abuso
excessivo de processos de suspensão e de alteração ao Plano, que na opinião de «Os Verdes»
têm prejudicado um desenvolvimento planeado, ordenado e harmonioso da cidade de
Lisboa.
Há
algumas questões que não podem deixar de ser referidas, como o facto desta
revisão se ter iniciado sem haver um Plano Estratégico, pois apenas em 2009 se
começou a elaborar a Carta Estratégica de Lisboa 2010-2024.
Esta
proposta foi apresentada, retirada, perdeu-se-lhe o rasto algures na Câmara
Municipal e, até hoje, continuamos à espera.
Assim,
e contrariando o que aconteceu com o PDM hoje em vigor, esta proposta não é
precedida de um plano estratégico.
Isto
leva-nos, obrigatoriamente, para a forma como a CML tem insistido num modelo de
planeamento baseado num rol interminável de Planos de Pormenor e de Planos de
Urbanização que têm vindo a retalhar a cidade de Lisboa, sem ter uma visão
integrada e global para a cidade no seu todo.
Também
a nível do prazo para a discussão pública, é importante referir o tempo
limitado para essa discussão, tendo em conta a importância e complexidade deste
documento.
Entrando
no conteúdo da proposta de revisão do PDM, são definidas 4 prioridades
estratégias, 7 objectivos estratégicos, assim como 7 políticas
urbanísticas/territoriais. De entre as prioridades estratégicas é mais ou menos
consensual a importância de Regenerar a Cidade Consolidada e de Promover a
Qualificação Urbana, daí que tenha sido estabelecido como um dos objectivos
estratégicos a Reabilitação Urbana que permita um melhor aproveitamento do
património edificado e das infra-estruturas já existentes na cidade de Lisboa.
Para
atingir este objectivo, o PDM prevê como principais instrumentos os incentivos
fiscais, através da diminuição das taxas urbanísticas, e o sistema de
incentivos a operações urbanísticas de interesse municipal através da
atribuição de créditos de edificabilidade ou construção, definidos no artigo
84º do regulamento do PDM, que, no fundo, são uma forma específica de moeda,
neste caso uma moeda em m2, em que, quando o proprietário ou titular das
operações urbanísticas cumprir determinados pressupostos, são atribuídos
direitos acrescidos de edificabilidade ou construção em metros quadrados.
Esses
créditos de edificabilidade ou construção podem ser transaccionáveis a
terceiros, ou seja num mercado de moeda de edificabilidade, favorecendo, assim,
a criação de um mercado especulativo que tende a favorecer os grandes
promotores imobiliários.
Este
mecanismo de créditos de edificabilidade ou construção não resolve os problemas
das AUGI – Áreas Urbanas de Génese Ilegal, não resolve os problemas da
reabilitação urbana nos bairros sociais e em alguns dos bairros históricos mais
carenciados, nem resolve o problema dos antigos núcleos rurais ou operários que
ainda subsistem na cidade de Lisboa.
A
proposta de PDM prevê, para além das Unidades Operativas de Planeamento e
Gestão, as Unidades de Execução, que constituem o instrumento preferencial de
execução do Plano, e que permitem a realização de operações urbanísticas em
conjunto por opção da CML, com escala adequada, cabendo exclusivamente à CML a
sua delimitação.
«Os Verdes» entendem que a
Assembleia Municipal deverá também apreciar e deliberar sobre as propostas de
delimitação das Unidades de Execução apresentadas pela CML.
Destacamos
ainda 6 aspectos manifestamente negativos nesta proposta de Revisão do PDM de
Lisboa:
Em
primeiro lugar, a impermeabilização dos solos na cidade de Lisboa prolifera na
zona ribeirinha da cidade com a construção de edifícios com caves de vários
pisos subterrâneos, destinados a parques de estacionamento, como por exemplo no
Aterro da Boavista.
Por
outro lado, uma cobertura em laje de betão revestida de espécies
herbário-arbustivas nunca cumprirá a função na ecologia urbana de um logradouro
ou jardim, pelo que a fórmula de cálculo do conceito de “Superfície Vegetal
Ponderada”, valoriza de forma excessiva as superfícies vegetais aplicadas sobre
as lajes como contributo para a criação daquelas áreas verdes.
Segundo
ponto, o Parque Florestal de Monsanto, apesar de estar sujeito ao regime
florestal total, tem vindo a ser substancialmente reduzido para urbanizações e
equipamentos, com fortes impactos negativos ao nível do abate de árvores, da
impermeabilização do solo, do aumento exponencial do trânsito e do alargamento
dos caminhos.
Terceiro
ponto, esta proposta não acautela devidamente a prevenção e mitigação de riscos
naturais e antrópicos no PDM, nomeadamente as ilhas de calor e as inundações,
pois permite a construção em cave em zonas em que a vulnerabilidade a
inundações é qualificada de “muito elevada”, e não identifica as ilhas de calor
na cidade e define medidas mitigadoras dos seus efeitos nas áreas
identificadas. Assim, a autarquia deverá avançar com a implementação de medidas
de alerta e mitigação de riscos relacionados com maremotos e sismos.
Quarto
ponto, em relação à rede de transportes públicos colectivos, nas plantas de
qualificação do espaço urbano e de acessibilidades e transportes não se
encontram assinaladas a rede ferroviária existente e prevista, a rede de
metropolitano existente e prevista, a rede ciclável existente e prevista e a
rede de eléctricos existente e prevista e o PDM não prevê a possibilidade de
utilizar materiais com maior grau de permeabilização no pavimento destinado às
ciclovias e nas áreas de estacionamento à superfície.
Para
reduzir o fluxo resultante da circulação de transporte privado e individual na
cidade de Lisboa era fundamental a criação de parques de estacionamento
dissuasores junto aos concelhos limítrofes de Lisboa, em articulação com a
criação de interfaces de transportes públicos colectivos. Não estão previstas
no PDM medidas que respondam às carências de estacionamento para residentes
nalgumas áreas da cidade, pelo que não se compreende a possibilidade, prevista
no regulamento do PDM, de redução do número de lugares de estacionamento a
ceder ao Município como contrapartida de operações de promoção imobiliária.
Em
quinto lugar, a constatação de que, com excepção da Carta de Equipamentos
Desportivos, todas as restantes cartas de equipamentos se encontram
desactualizadas.
As
diversas Cartas de Equipamentos, e não só a Carta Educativa, deveriam integrar
o conteúdo documental do PDM pois os equipamentos colectivos devem ser
encarados como dinamizadores da economia e da vivência local onde se encontram
e não como condicionantes fortes do PDM.
A autarquia
optou por elaborar programas sectoriais, como por exemplo o Programa de Bibliotecas
XXI ou o Programa de Creches, em detrimento da elaboração de uma Carta de
Equipamentos Culturais e de uma Carta de Equipamentos Sociais que permitiriam
dar uma visão mais global e integrada às necessidades de resposta coordenada
nestes domínios, procurando tirar partido de eventuais sinergias de recursos e
esforços entre os diversos agentes de desenvolvimento local.
Por
fim, o sexto ponto relacionado com a delapidação e alienação do património
edificado da cidade de Lisboa, como por exemplo dos Hospitais Civis de Lisboa,
de grande valor patrimonial, cultural, histórico, arquitectónico e artístico. O
PDM é omisso no reconhecimento do valor patrimonial do mobiliário urbano
histórico e de época, como os candeeiros de iluminação pública, bancos de
jardim ou bebedouros, assim como ignora a valorização e a salvaguarda do
património de azulejaria de fachada e de interior que constitui um factor
identitário nacional de expressão cultural e artística de excelência.
Em
Lisboa, nas últimas décadas, têm sido constantes as intervenções no subsolo com
achados portuários e náuticos.
Devido
à elevada sensibilidade arqueológica e ao potencial arqueológico na zona
ribeirinha, o regulamento do PDM devia prever medidas de acompanhamento
arqueológico para todas as operações urbanísticas com fortes intervenções no
subsolo nesta área, com vista a salvaguardar todos os “vestígios da época de
ouro de Portugal”.
Em
síntese, esta proposta de revisão representa uma oportunidade perdida e
subaproveitada, não se orientando para as necessidades e vivências das pessoas,
mas antes para a promoção da especulação imobiliária. Este novo PDM deveria ir
ao encontro das preocupações e da resolução dos problemas manifestados ao longo
dos últimos anos, mas é antes um instrumento de gestão do território
prejudicial para a cidade.
Para «Os Verdes»,
este PDM não resolve os problemas, não vem colmatar as lacunas do PDM de 1994 e
não é, seguramente, o instrumento de planeamento e gestão urbana que a cidade
está a precisar.
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