21/05/2014

Intervenção do deputado municipal do PEV, Sobreda Antunes, na 1ª sessão do debate sobre transportes - "Os transportes que temos e como funcionam”


Até ao final do ano, o Governo pretende abrir à iniciativa privada a exploração dos serviços públicos de transporte de passageiros prestados actualmente por empresas na esfera do Estado, no âmbito do Memorando de Entendimento assinado com a ‘troika’. O principal objectivo desta abertura à iniciativa privada é o de reduzir os encargos do Estado, pondo assim em causa o serviço público de transporte colectivos de passageiros. Esta operação abrangerá os serviços explorados pelas empresas Companhia Carris de Ferro de Lisboa, S.A., Metropolitano de Lisboa, E.P.E., Sociedade Transportes Colectivos do Porto (STCT), Metro do Porto, Transtejo e CP.

Tal acontece logo agora que estas empresas se tornaram ainda mais apetecíveis para os privados, pois, como o próprio Secretário de Estado dos Transportes realçou, as empresas de transporte público tiveram, pelo segundo ano consecutivo, um EBITDA (ou seja, ganhos antes de juros, impostos e amortizações) positivo, com, em 2012, um EBITDA um pouco superior a quatro milhões de euros e, em 2013, um EBITDA positivo de três milhões e meio de euros. Sendo intenção do Governo lançar os concursos até ao próximo mês de Junho, é óbvio que, mais uma vez, o Governo se prepara para privatizar ‘bife do lombo’.

O Estado tem assim pressa em concessionar os transportes. Mas com a sua precipitação ‘tróiquista’, o Governo esqueceu-se de produzir os estudos essenciais, desconhecendo-se os dados que poderiam ser obtidos com o Inquérito à Mobilidade, o Plano Operacional de Transportes e o Plano de Deslocações Urbanas, pondo em causa a correcta definição do serviço público de transporte.

Sobre a titularidade das empresas Carris e Metropolitano de Lisboa, a CML anunciou o interesse em candidatar-se à sua gestão. Deste modo, foi apresentada na reunião de CML do passado dia 15 de Abril a Proposta nº 164/2014 com uma tomada de posição da CML no âmbito do processo de avaliação das alternativas ao actual modelo de titularidade e gestão das 2 empresas. Nessa Proposta procurou-se acautelar que o modelo a acordar não afectaria o equilíbrio operacional das empresas, nem o equilíbrio financeiro do município, e que seria salvaguardada a unidade da prestação do serviço público, excluindo a concessão a privados, parcial ou total da exploração de ambas as empresas.

Mas parte da restante deliberação esbarra num conjunto de particularidades de relevância para a estratégia a prosseguir em todo este processo, como veremos.

A 1ª delas é que o Governo só aceita a concessão à CML se a autarquia da capital assegurar que o Estado não terá de pagar as indemnizações compensatórias, que são actualmente da responsabilidade do organismo competente do Ministério das Finanças. Como garantir então o financiamento das 2 empresas?

2º, como se sabe, a CML faz parte do Conselho Geral da Autoridade Metropolitana de Transportes de Lisboa (AMTL), que tem, entre outras atribuições, a incumbência de definir redes, serviços, tarifários, etc. A AMTL tem a responsabilidade de tornar o sistema de transportes da Área Metropolitana de Lisboa mais sustentável do ponto de vista social, ambiental, económico e financeiro, procurando respostas eficazes às diferentes necessidades de mobilidade da população. Deve contribuir, designadamente, para reforçar a importância do sistema de transporte público colectivo, aumentar as taxas de ocupação, as receitas e a produtividade, aumentar a intermodalidade e a interoperabilidade reduzir a dependência do transporte individual, bem como tornar o sistema tarifário mais simples e racional.
Porém, esta entidade não tem passado de um mero organismo delegado da Secretaria de Estado dos Transportes, sendo indispensável reestruturar as suas competências e reforçar o papel da AMTL que, na actual situação em que se encontra, não cumpre o seu papel regulador. Há assim que actuar no âmbito da AMTL para alterar os seus estatutos, de modo a que não seja uma entidade governamentalizada, mas sim uma estrutura onde as autarquias tenham uma intervenção determinante, na coordenação dos diversos operadores, no planeamento e no financiamento de um verdadeiro sistema de transportes que assente no serviço público.

3º, um factor de ‘pormaior’. Sejam quais forem os consensos a as negociações a que CML e Governo chegarem, sejam quais forem as conclusões a que esta série de debates nesta AML chegue, há uma decisão que é obviamente incontornável.

Ao longo de décadas, a Carris ganhou serviço suburbano, pois chega a Alfragide, à Caparica e ao Centro Sul, ao Dafundo e à Cruz Quebrada, à Damaia, a Linda-a-Velha, a Odivelas, a Moscavide e à Portela, e nos últimos anos a rede do Metropolitano chegou à Amadora, a Moscavide e a Odivelas. Ou seja, estas duas empresas não servem apenas a capital, mas também, e directamente, os concelhos limítrofes de Almada, Amadora, Odivelas, Oeiras e Loures. Então por que ‘carga de água’ pretende o município de Lisboa ter o papel exclusivo da sua gestão? Faltar-lhe-á capacidade de diálogo ou humildade?

Em conclusão, para “Os Verdes”, a gestão das empresas deve manter-se na esfera pública, excluindo a concessão a privados. A sua coordenação terá de passar pela Autoridade Metropolitana de Transportes de Lisboa. Todos os municípios servidos pela Carris e pelo Metro terão de ter sempre uma palavra a dizer sobre os direitos dos seus utentes de transportes públicos.

Assembleia Municipal de Lisboa, 20 de Maio de 2014
J. L. Sobreda Antunes

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