Até ao final do ano, o Governo pretende abrir à iniciativa privada a
exploração dos serviços públicos de transporte de passageiros prestados actualmente
por empresas na esfera do Estado, no âmbito do Memorando de Entendimento
assinado com a ‘troika’. O principal objectivo desta abertura à iniciativa
privada é o de reduzir os encargos do Estado, pondo assim em causa o serviço
público de transporte colectivos de passageiros. Esta operação abrangerá os
serviços explorados pelas empresas Companhia Carris
de Ferro de Lisboa, S.A., Metropolitano de Lisboa, E.P.E., Sociedade
Transportes Colectivos do Porto (STCT), Metro do Porto, Transtejo e CP.
Tal acontece logo agora que estas empresas se tornaram ainda mais
apetecíveis para os privados, pois, como o próprio Secretário de Estado dos
Transportes realçou, as empresas de transporte público tiveram, pelo segundo
ano consecutivo, um EBITDA (ou seja, ganhos antes de juros, impostos e
amortizações) positivo, com, em 2012, um EBITDA um pouco superior a quatro
milhões de euros e, em 2013, um EBITDA positivo de três milhões e meio de
euros. Sendo intenção do Governo lançar os concursos até ao próximo mês de
Junho, é óbvio que, mais uma vez, o Governo se prepara para privatizar ‘bife do
lombo’.
O Estado tem assim pressa em concessionar os transportes. Mas
com a sua precipitação ‘tróiquista’, o Governo esqueceu-se de produzir os
estudos essenciais, desconhecendo-se os dados que poderiam ser obtidos com o
Inquérito à Mobilidade, o Plano Operacional de Transportes e o Plano de
Deslocações Urbanas, pondo em causa a correcta definição do serviço público de
transporte.
Sobre a titularidade das empresas Carris e Metropolitano de
Lisboa, a CML anunciou o interesse em candidatar-se à sua gestão. Deste modo,
foi apresentada na reunião de CML do passado dia 15 de Abril a Proposta nº
164/2014 com uma tomada de posição da CML no âmbito do processo de avaliação
das alternativas ao actual modelo de titularidade e gestão das 2 empresas.
Nessa Proposta procurou-se acautelar que o modelo a acordar não afectaria o
equilíbrio operacional das empresas, nem o equilíbrio financeiro do município,
e que seria salvaguardada a unidade da prestação do serviço público, excluindo
a concessão a privados, parcial ou total da exploração de ambas as empresas.
Mas parte da restante deliberação esbarra num conjunto de
particularidades de relevância para a estratégia a prosseguir em todo este processo,
como veremos.
A 1ª delas é que o Governo só aceita a concessão à CML se a
autarquia da capital assegurar que o Estado não terá de pagar as indemnizações
compensatórias, que são actualmente da responsabilidade do organismo competente
do Ministério das Finanças. Como garantir então o financiamento das 2 empresas?
2º, como se sabe, a CML faz parte do Conselho Geral da Autoridade
Metropolitana de Transportes de Lisboa (AMTL), que tem, entre outras
atribuições, a incumbência de definir redes, serviços, tarifários, etc. A AMTL
tem a responsabilidade de tornar o sistema de transportes da Área Metropolitana
de Lisboa mais sustentável do ponto de vista social, ambiental, económico e
financeiro, procurando respostas eficazes às diferentes necessidades de mobilidade
da população. Deve contribuir, designadamente, para reforçar a importância do
sistema de transporte público colectivo, aumentar as taxas de ocupação, as receitas
e a produtividade, aumentar a intermodalidade e a interoperabilidade reduzir a
dependência do transporte individual, bem como tornar o sistema tarifário mais
simples e racional.
Porém, esta entidade não tem passado de um mero organismo delegado da
Secretaria de Estado dos Transportes, sendo indispensável reestruturar as suas
competências e reforçar o papel da AMTL que, na actual situação em que se
encontra, não cumpre o seu papel regulador. Há assim que actuar no âmbito da
AMTL para alterar os seus estatutos, de modo a que não seja uma entidade
governamentalizada, mas sim uma estrutura onde as autarquias tenham uma
intervenção determinante, na coordenação dos diversos operadores, no
planeamento e no financiamento de um verdadeiro sistema de transportes que
assente no serviço público.
3º, um factor de ‘pormaior’. Sejam quais
forem os consensos a as negociações a que CML e Governo chegarem, sejam quais
forem as conclusões a que esta série de debates nesta AML chegue, há uma
decisão que é obviamente incontornável.
Ao longo de décadas, a Carris ganhou serviço suburbano,
pois chega a Alfragide, à Caparica e ao Centro Sul, ao Dafundo e à Cruz
Quebrada, à Damaia, a Linda-a-Velha, a Odivelas, a Moscavide e à Portela, e nos
últimos anos a rede do Metropolitano chegou à Amadora, a Moscavide e a
Odivelas. Ou seja, estas duas empresas não servem apenas a capital, mas também,
e directamente, os concelhos limítrofes de Almada, Amadora, Odivelas, Oeiras e
Loures. Então por que ‘carga de água’ pretende o município de Lisboa ter o
papel exclusivo da sua gestão? Faltar-lhe-á capacidade de diálogo ou humildade?
Em conclusão, para “Os Verdes”, a gestão das empresas deve
manter-se na esfera pública, excluindo a concessão a privados. A sua
coordenação terá de passar pela Autoridade
Metropolitana de Transportes de Lisboa. Todos os municípios servidos pela
Carris e pelo Metro terão de ter sempre uma palavra a dizer sobre os direitos
dos seus utentes de transportes públicos.
Assembleia Municipal de Lisboa, 20 de Maio de 2014
J. L. Sobreda Antunes
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