Assembleia Municipal de Lisboa, 11 de Março de 2014
A Petição nº 1/2014 surge no contexto da transferência de competências entre a CML e as Juntas de Freguesia e nas indefinições em que se encontram parte dos equipamentos culturais, como é o caso de algumas Bibliotecas Municipais da actual Rede BLX. “Os Verdes” querem, por isso, saudar esta iniciativa dos 1.105 peticionários.
A Proposta nº 915/2013 indicava que as ‘bibliotecas-âncora’ e as não estruturantes que transitariam para as Juntas de Freguesia integrariam a Rede BLX, sendo geridas no âmbito do Programa Estratégico Biblioteca XXI, quer para efeitos de gestão do acervo bibliográfico, como do tratamento técnico documental e empréstimo entre bibliotecas.
É sobejamente reconhecido que uma biblioteca devidamente inserida no seu bairro contribui para reforçar as redes sociais e diminuir as situações de isolamento social. Mas devido às deficientes condições em que algumas se encontram, é expectável que as Juntas que as receberem tenham de alocar investimentos consideráveis para as recuperar.
De facto, alguns presidentes de Junta já começaram a perceber que vão ficar no seu regaço com alguns edifícios pouco atractivos. É que, já em 2012, um estudo encomendado pela própria vereação constatara haver edifícios desadequados à missão das bibliotecas, bem como uma cobertura territorial muito insuficiente. Concluíra a CML também que apenas as bibliotecas das Galveias, de Belém e a recentemente encerrada Hemeroteca cumpriam os mínimos, mas que as restantes não tinham em consideração os padrões de exigência em vigor, por possuírem “áreas exíguas e subdimensionadas, com espaços muito compartimentados”.
Por isso, o Grupo Municipal de “Os Verdes” volta a questionar o executivo sobre como poderá uma Freguesia dar resposta à melhoria da qualidade das instalações? Onde vai buscar as verbas? Será que uma biblioteca ‘não âncora’, que deseje fazer obras ou adquirir equipamentos, poderá (ou não) vir a concorrer a financiamentos autónomos?
Poderá candidatar-se ao Programa de Apoio às Bibliotecas Municipais ou terá de o fazer sempre na dependência da CML? Poderá definir uma política e um programa próprios de gestão para a sua biblioteca? Poderá adquirir espólios bibliográficos que considere relevantes ou terá de pedir um parecer técnico prévio à CML? Poderá adaptar metodologias independentes para produtos e serviços documentais que pretenda disponibilizar ao seu universo de utilizadores? Poderá estabelecer horários de abertura ao público reduzidos ou desadequados às necessidades dos leitores? Poderá uma Freguesia aprovar uma tabela de taxas distintas? Poderá criar um mapa de pessoal sem técnicos com especialização BAD? Será que cada biblioteca não passará assim a organizar de forma desenquadrada debates ou exposições e outras actividades culturais e lúdicas?
Por deixar de haver uma política comum, não se caminha assim para uma fácil desintegração do funcionamento em rede das BLX? Não será que também tem havido, nestes últimos anos, um claro desinvestimento progressivo dos serviços de leitura presencial prestados à população, com a redução para apenas uma das carrinhas de bibliotecas móveis do município e do seu percurso de circulação por entre os bairros carenciados da cidade?
Uma situação que consideramos muito preocupante foi a própria direcção municipal ter respondido, numa das Comissões desta AML, poder ser dispensável a direcção técnica dos profissionais BAD (de Biblioteca, Arquivo e Documentação)! Como é possível uma biblioteca não ser gerida por um profissional da área? Será que a CML pediu algum parecer técnico prévio à BAD, à DGLAB - Direcção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas, ou mesmo à própria Biblioteca Nacional e estes organismos anuíram neste sentido? Duvidamos profundamente que tal tenha acontecido.
Foi face à gravidade destes acontecimentos que o Conselho Directivo Nacional da Associação Portuguesa de Bibliotecários, Arquivistas e Documentalistas apresentou uma tomada de posição pública onde demonstrou a sua preocupação com este caso. A BAD afirma ter sérias dúvidas quanto a esta decisão da CML e receia o impacto que ela terá nos utilizadores, nos serviços prestados em rede, nas actividades e nas funções e atribuições dos bibliotecários e demais funcionários que serão também transferidos para os quadros das respectivas Juntas de Freguesia.
Num momento da conjuntura nacional em que diariamente os cidadãos assistem a uma redução no investimento público na área cultural, e atendendo ao excelente serviços prestado à população pela Rede BLX, importa garantir que a CML mantém os seus compromissos para com os munícipes e gira de forma correcta e coerente todos os equipamentos culturais de proximidade que ao longo dos anos tem vindo a colocar à disposição da população considerando as suas bibliotecas agentes decisivos na execução de políticas activas de promoção da aprendizagem ao longo da vida, no contacto com o livro, na promoção da leitura, no acesso à informação, à cultura e ao lazer e no combate à iliteracia digital e à exclusão.
Sabemos que o Conselho Directivo Nacional da BAD já solicitou ao executivo municipal informações sobre os critérios de selecção das bibliotecas a transferir, do acautelar da continuidade da gratuitidade dos serviços prestados, da sustentabilidade da gestão das bibliotecas pelas Juntas de Freguesia, sobre a salvaguarda dos postos de trabalho de todos os funcionários das bibliotecas municipais e de qual o futuro dos serviços transversais da actual Rede BLX, em especial no que diz respeito ao Serviço de Tratamento Técnico, à utilização do cartão de leitor das BLX, aos custos para os utilizadores e à gestão do Catálogo Colectivo.
Com base nestas preocupações, a BAD solicitou a marcação de uma reunião com a senhora vereadora da Cultura, com o objectivo de melhor acompanhar este processo, reunião que estará agendada para o próximo dia 21 de Março.
Em conclusão, a CML não desmente as preocupações dos Peticionários e da BAD em como a sua proposta veio pôr em causa o Programa Estratégico Biblioteca XXI da própria CML, porque a gestão em rede implica uma visão integrada para todo o território da cidade e uma gestão coordenada que permita uma mais eficaz articulação, racionalização, cooperação e partilha de recursos e serviços aos utentes das Bibliotecas Municipais.
J. L. Sobreda Antunes
Grupo Municipal de “Os Verdes”
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