Assembleia Municipal de Lisboa de 10 de
Março de 2015
Analisamos
hoje o 3º relatório trimestral de monitorização sobre o processo da Reforma
Administrativa de Lisboa, o qual pretende espelhar o estado da arte até finais
de 2014.
Defende-se
que o objectivo da reforma em curso se centra no esvaziamento das obrigações
camarárias e no reforço das competências das Juntas, por estas deterem um maior
conhecimento local. Diz-se, também, que se pretende dar sequência aos
anteriores protocolos de delegação de competências, para que passem agora de
anuais a definitivos, a fim de permitir a consolidação de alguns instrumentos,
como orçamentos participativos, a Agenda XXI Local ou os Conselhos de Freguesia
ou de Bairro. Porém, passado mais de um ano, ainda não se divisa nenhum destes
desideratos.
O
processo até não estaria tão errado se salvaguardasse a coerência de uma gestão
municipal integrada e equitativa para todos os trabalhadores e munícipes. Mas
será que é cumprida esta aspiração? E será que esta sequência de relatórios de
monitorização reporta, para além de observações elogiosas, as reais
disfuncionalidades da reforma em curso?
Façamos
então algumas citações. Convém recordar que estes relatórios são executados por
‘mão de obra’ da casa, pelo que não poderão ser totalmente imparciais em causa
própria. Diz-se depois na p. 9, que a CML “tem disponível para consulta” a
documentação sobre o processo desta reforma, desde os autos e seus anexos, aos
dossiês técnicos e aos acordos tripartidos. Se os tem, passado mais de um ano,
esta Assembleia continua a desconhecê-los.
Quanto
à metodologia da monitorização, ela terá concertado entrevistas a dirigentes,
com grupos de estudo e idas ao terreno, reconhecendo, no entanto, o próprio
‘Grupo de Acompanhamento e Monitorização da Reforma Administrativa de Lisboa’,
na p. 16, que os indicadores quantitativos que obtiveram sobre as diversas
áreas são afinal desiguais e escassos.
Quanto
à transferência dos recursos financeiros, a CML e as Juntas terão promovido a
reavaliação das receitas e dos custos. Os saldos apurados terão levado a
eventuais correcções financeiras para acerto das assimetrias. Mas o facto é que
não apenas subsistem disparidades alertadas pelos executivos de algumas Juntas,
como é recorrente esta Assembleia se deparar com ‘incoerências’ entre saldos e
défices, o que tem inviabilizado um correcto acompanhamento deste plenário e
uma compreensão clara e objectiva por parte dos GMs.
Já
quanto à transição dos recursos humanos, dos 185 registos de voluntários, apenas
93 foram aceites nas Juntas. Os restantes 85 acabariam por não transitar, ou
por não terem sido aceites pelos executivos ou porque acabaram de desistir do
seu próprio registo de voluntariado, o que denota o receio óbvio pela mudança
para o incerto.
Fazendo-se
uma análise integrada das três fases de transição de recursos humanos da CML
para as 24 Juntas de Freguesia, procedeu-se à transição de 1270 funcionários,
baixando a taxa de satisfação de 95% para apenas 27,5%, o que terá sido
verdadeiramente sintomático das incertezas sobre o desenrolar deste processo. Ou
seja, para alem do regime de voluntariado não ter obtido os resultados
esperados, também muitos dos funcionários se defrontaram com dúvidas sobre a sua
segurança laboral, casos de desigualdade no acesso aos serviços sociais e urgência
da manutenção de outros direitos, levando esses trabalhadores a manifestarem
publicamente o seu protesto perante a perspectiva de extinção futura do seu
posto de trabalho no município.
Quanto
à transferência de meios, o relatório atesta na p. 66 que subsistem as
anteriormente denunciadas “avarias nos equipamentos mecânicos e veículos
recebidos”, facto que uma coordenação centrada no DRMM, facilmente poderia
solucionar se, para tal, houvesse uma visão de conjunto e vontade política por
parte da CML, o que, notoriamente, não existe.
Também
na manutenção dos espaços verdes e jardins, a p. 71 do relatório evidencia a
extensão e o mau estado das estruturas recebidas, não complementadas com os
recursos humanos necessários, pelo que as Juntas optaram por soluções de
facilitismo com a contratualização de serviços externos, o que demonstra que o
processo em curso conduziu à inversão da prestação de um serviço que deveria
ser público. Ou seja, é indesmentível que se incrementaram em algumas Juntas os
recibos verdes e os ‘outsourcings’.
Quanto
aos equipamentos escolares subsiste a necessidade de realização de obras pela
CML, visto as Juntas não disporem dos necessários meios financeiros. Os
executivos, ao referirem a falta de informação sobre contratos, custos de
manutenção e investimentos previstos, confirmam um grau de preocupação
relativamente elevado (p. 87). Existem também relevantes problemas de
manutenção de alguns equipamentos desportivos e casos de Juntas que aprovaram
novas tabelas de taxas diferenciadas, aumentando de forma relevante os preços
(p. 92). E a situação repete-se lamentavelmente com o mau estado de conservação
de vários parques infantis (p. 99).
O
relatório constata o facto de algumas Juntas ainda não se apresentarem
tecnicamente preparadas para executar as competências transferidas, existindo
por isso alguma apreensão na sua gestão. Os próprios recursos humanos, afectos
a serviços que não perderam competências, identificaram inclusive dificuldades
internas, como a sobrecarga dos trabalhadores que permaneceram nos serviços da
CML. E quanto ao processo de transição em si, até os dirigentes reconheceram
que há serviços a serem prestados de forma diferenciada, consoante cada Junta
de Freguesia.
A
disparidade destas situações poderia ter sido previamente resolvida com a
elaboração de regulamentos municipais comuns, o que a CML não acautelou. E
porque não promoveu a CML estas soluções óbvias? Pela sua ânsia e precipitação
na rápida imposição das transferências.
Em
conclusão: o relatório diz-nos que continuam a observar-se problemáticas
comuns, persistindo a fragmentação de políticas e a duplicação de serviços. São
sentidas insuficiências pela falta de recursos humanos qualificados, conducente
à contratação de serviços externos, limitações impostas pelo estatuto dos
eleitos locais, o desajustamento de recursos financeiros e de contratos, a
insuficiência das instalações, taxas diferenciadas, o mau estado e as avarias patentes
em inúmeros equipamentos transferidos, os custos das necessárias manutenções,
etc.
Pelo
que o Grupo Municipal de “Os Verdes” interroga se a CML assume ou não os encargos pela reparação dos
equipamentos com problemas ou se a despesa terá de sair dos orçamentos das
Juntas. Gostaríamos também de entender, passado um ano, para que serviram
afinal estes Relatórios se, entre o 1º e o 3º, a CML não corrige as
deficiências apontadas aos serviços municipais transitados.
Assumindo
os relatórios uma atitude laudatória, não deixam de desencobrir o véu das
fragilidades sentidas neste processo. Pergunta-se: até ao momento, o que
ganharam os munícipes e os trabalhadores com ele?
J. L. Sobreda Antunes
Grupo
Municipal de “Os
Verdes”
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