28/04/2015

Declaração política sobre «Escolas de ensino artístico especializado»


Assembleia Municipal de Lisboa, 28 de Abril de 2015

1ª Intervenção:
Para a declaração política de hoje “Os Verdes” seleccionaram o tema do “ensino artístico especializado”, porque consideramos que este Governo tem desvalorizado o ensino público em Portugal, denotando as escolas de ensino artístico com falhas de financiamento, quer nas públicas, quer nas do ensino particular e cooperativo, para que possam funcionar devidamente e com a dignidade que os seus beneficiários e profissionais merecem e têm direito.
As escolas do ensino artístico especializado - que complementam a oferta da escola pública - têm perto de 4.000 professores e são frequentadas por cerca de 24 mil alunos. Hoje mesmo estas escolas vão manifestar-se com música à porta do Ministério, em Lisboa, onde estarão vários directores das escolas a associarem-se à manifestação apoiada pela Federação Nacional de Professores.
Há profissionais destas escolas que clamam ao País, designadamente ao Governo, condições de sobrevivência, para que lhes seja pago o salário que lhes é devido pelo seu trabalho, porque lhes falha o pagamento para poderem sobreviver. E o que é que o Ministério da Educação vem fazendo nestas circunstâncias? Finge que ouve, mas não ouve, ou que dialoga, mas apenas adia decisões, lançando culpas para o Tribunal de Contas, que lhas devolve imediatamente, reconhecendo a incompetência do Ministério da Educação nesta matéria.
Segundo palavras dos próprios docentes, citamos, “as pessoas não imaginam o que é gerir uma escola assim: se tivermos dívidas à segurança social ou ao fisco não podemos receber as verbas comunitárias; mas como o Estado não garante que essas verbas nos cheguem às escolas no tempo devido, temos de fazer empréstimos pessoais sobre os quais pagamos juros para cumprirmos as nossas obrigações para com o mesmo Estado”. “O problema não é de hoje, tem quatro anos. Basta de nos sujeitarmos a esta situação incrível, que é a de vivermos em agonia e só recebermos o dinheiro a que temos direito quando fazemos pressão”!
Para “Os Verdes”, o ensino não pode viver nestas circunstâncias. O que se tem passado com as escolas de ensino artístico especializado é absolutamente intolerável, com situações de atrasos salariais e incapacidade para o pagamento de um conjunto de compromissos que as escolas têm, incluindo com as finanças e com a segurança social. Aconteceu mesmo o caso de escolas que, estranguladas por esta situação, se viram na iminência ou foram mesmo forçadas a encerrar portas ou a parcialmente suspenderem as aulas. Trata-se de uma lamentável situação que demonstra o desrespeito e a inaptidão do Governo em relação à educação em Portugal.
Neste contexto, “Os Verdes” propõem hoje que esta Assembleia delibere instar o Governo a reconhecer a atenção e a prioridade que o ensino artístico especializado merece, garantindo o relevante papel das escolas de Ensino Artístico Especializado e pugnando pelo direito do acesso à educação e pela dignificação do ensino, responsabilizando o Estado pela promoção dos direitos dos cidadãos, tal como consagrado na Constituição da República Portuguesa.
Por isso, propõe-se que se apele ao Governo para que promova diligências para que nenhuma escola deixe de prestar o ensino artístico especializado por razões relacionadas com o atraso da atribuição de verbas estatais, que o Ministério regularize o financiamento das escolas através do Orçamento de Estado, garantindo o cumprimento de prestações futuras relativas ao ano lectivo em curso, e desobrigando-as de quaisquer encargos adicionais com entidades externas causados por eventuais atrasos na transferência de verbas, que o Governo cumpra os prazos de candidatura ao financiamento público por parte dos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo, de modo a garantir a atribuição dos montantes necessários ao seu funcionamento no início de cada ano lectivo, que reformule os planos de estudo e programas curriculares nas diversas disciplinas do ensino especializado, alterando também as regras de acesso ao ensino superior em tempo útil para o próximo concurso, e que finalmente encontre, em conjunto com as suas organizações representativas, soluções para os problemas laborais específicos dos docentes do Ensino Artístico Especializado.
Por fim, gostaríamos, em nome do Grupo Municipal do Partido Ecologista “Os Verdes”, de deixar uma saudação às escolas de ensino artístico especializado, seus professores, funcionários, estudantes e famílias que têm sido tão profundamente afectados por estas situações e que hoje mesmo se manifestam em frente ao Ministério da Educação.

Sobreda Antunes
Grupo Municipal de “Os Verdes

2ª intervenção (em resposta):
Srªs e srs deputados. Tem havido uma notória falta de atenção do Governo em prestar ao ensino especializado das Artes no nosso país os cuidados que lhe são devidos. Entre muitos constrangimentos, as escolas do ensino artístico especializado debatem-se com os obstáculos legislativos, falta de financiamento atempado, instalações precárias, inexistência de planos de formação, ausência de mecanismos de recrutamento e ingresso em quadros, situações a que urge pôr termo.
Num tal ambiente de abandono, têm as escolas públicas mobilizado esforços no sentido da constante melhoria das práticas educativas, da diversidade das ofertas, da disponibilização do acesso a este tipo de ensino ao maior número possível de crianças e jovens. Realce-se, também, o insubstituível papel de difusão cultural que estas escolas desempenham nas comunidades e nas áreas em que estão implantadas, demonstrado pelas dezenas de concertos promovidos por sua iniciativa, ano após ano, dentro e fora de portas.
Na sequência da publicação de um estudo de avaliação do ensino artístico especializado, a actual equipa do ME tomou a iniciativa de levar a cabo um processo a que chamou de "refundação" daquela modalidade de ensino. O conjunto destas directivas parece mais orientado para a redução a dimensões quase simbólicas da presença da escola pública nesta área, do que para a efectiva resolução dos problemas existentes.
As ameaças passam pela extinção das práticas de ensino especializado a crianças do 1º ciclo do EB e dos regimes de frequência supletivo e articulado (que, na prática, inviabilizam a frequência destas escolas por jovens que habitem e estudem fora das zonas onde funcionam as escolas do ensino especializado). Com tais medidas, a pretexto da melhoria da qualidade do ensino ministrado, o Ministério da Educação propõe a redução drástica, por decreto, do número de alunos no ensino especializado público.
Porém, há outras alternativas para este panorama, tais como, proceder à ampliação da rede pública de escolas de ensino especializado, criação de redes de escolas especializadas nas outras áreas artísticas, manutenção dos três regimes de frequência actualmente em vigor: o articulado, o supletivo e o integrado, definindo claramente as respectivas finalidades e assegurando que em todas as escolas possam conviver os três regimes, reformular planos de estudo e programas nas diversas disciplinas do ensino especializado, e encontrando soluções alternativas para os problemas laborais específicos dos docentes do ensino artístico especializado que passem, designadamente:
- No ensino público, pela aplicação imediata de Recomendações da Assembleia da República para a promoção de medidas adequadas tendentes à integração em lugar de quadro dos docentes de técnicas, pela negociação e publicação de legislação que estabeleça critérios para a constituição dos quadros dos estabelecimentos de ensino artístico especializado, bem como a implementação de processos para que se proceda, em cada uma das escolas, à integração do pessoal docente em exercício.
- Mas também, no ensino particular e cooperativo, pela fiscalização das situações contratuais, penalizando situações de flagrante ilegalidade (como recibos verdes, contratos ilegais, etc.), pela celebração de contratos de patrocínio à observância da Lei no que respeita às condições contratuais e de prestação de serviço docente, pela articulação entre os vários níveis de ensino, principalmente entre o ensino especializado de nível secundário e o ensino superior especializado, por uma avaliação do actual quadro legal regulamentador do ensino artístico especializado, clarificando na lei o enquadramento deste tipo de ensino, generalizando no ensino público o acesso ao ensino especializado da música e da dança (bem como das outras formas de interpretação e expressão artística) aos alunos do 1º ciclo do ensino básico.
Soluções existem, o que falta é o Ministério da Educação dar cumprimento aos princípios de igualdade no acesso à educação consignados na Constituição da República Portuguesa.

Sobreda Antunes
Grupo Municipal de “Os Verdes

Sem comentários: