08/07/2008

Um ano de balanço entre património e ambiente

O quotidiano em Lisboa um ano após as eleições intercalares vive-se entre o “estado lamentável das ruas” e um “novo espírito” para a cultura, o património e o ambiente, de acordo com personalidades ligadas à capital. Reconhecem que “uma cidade não muda num ano” e que o executivo camarário liderado pelo PS eleito a 15 de Julho de 2007 enfrenta constrangimentos financeiros, mas reclamam as pequenas coisas que marcam a qualidade do quotidiano, como a limpeza do espaço público e a disciplina do trânsito.
Apesar do “estado calamitoso” das finanças camarárias, Appio Sottomayor, antigo jornalista do jornal ‘A Capital’, considera que “há tarefas que, pelo menos aos olhos do alfacinha - de certidão ou simples uso da cidade - parecem fáceis e não muito dispendiosas e que tardam”. “O trânsito continua caótico, as prometidas passadeiras para peões esmoreceram, há ainda descoordenação entre os transportes, os buracos pululam em muitas ruas, há jardins com ar triste e de abandono”, aponta o olisipógrafo.
A socióloga Maria Filomena Mónica que raramente sai do ‘perímetro Estrela-Lapa’, onde reside, queixa-se do “estado lamentável das ruas” mas enaltece o Jardim da Estrela, “que está cada vez mais bonito” e assume que algumas das “coisas positivas” que reconhece na cidade não se devem necessariamente à nova liderança da CML. É o caso dos concertos a que tem assistido na Basílica da Estrela e na Igreja dos Mártires, locais onde, como não é crente, não entrava há muito tempo e ficou “satisfeita” ao constatar que estão “maravilhosamente restaurados”.
Porém, “preocupa-me o estado do Terreiro do Paço. A ideia de que possam vir a transformar a praça numa zona com hoteizinhos, boutiquezinhas e cafezinhos horroriza-me. Sendo a sede e o símbolo do poder, deve continuar como está. Não precisa de mais nada, devendo apenas ser reposto o que de lá tiraram, as colunas”, defende.
O sociólogo Luís Salgado de Matos aponta, por seu lado, que “o emblema de Lisboa 2008” seja a “substituição do projecto Ghery para o Parque Mayer por um concurso de ideias”, lançado pela autarquia para a realização do plano de pormenor que sirva de base à reabilitação da zona.
Já Luísa Schmidt entende que o concurso de ideias pelo qual a autarquia optou “é um processo ainda com incógnitas”, mas aplaude a “solicitação à participação pública" que tem envolvido. Esta socióloga, especialista em Ambiente, e uma das impulsionadoras da iniciativa cívica ‘Um dia por Lisboa’, diz que “a cidade continua suja”, permanece uma “imagem de desmazelo” do espaço público e que na ausência de “um plano de mobilidade” e “apesar da operação das passadeiras, o peão continua a ser o parente pobre”.
Este diagnóstico é agravado por Luís Salgado de Matos, para quem Lisboa é ainda uma cidade de “obras que nunca acabam, engarrafamentos nas horas de ponta, prostituição de rua nas ruas de sempre, venda de droga aos estudantes do secundário, carros a atravancarem os passeios ou as passagens de peões ou em dupla fila, calçada intransitável, jardins públicos sujos, alcatroados e abandonados, recipientes colectivos de lixo que são lixeiras, árvores que adoecem e não são tratadas, falta de flores, excesso de mendigos, 'arrumadores' de automóveis”.
Para Luísa Schimdt, é um “óptimo sinal” que tenha sido “retomado a sério o Plano Verde”, acompanhado de “medidas cautelares” que protegem de operações urbanísticas áreas da cidade, como a frente ribeirinha, não acauteladas pelo PDM. “Pode dizer-se que esta vereação está a levar a sério as questões ambientais e do ordenamento do território”, resume, advertindo, contudo, que será “muito mau sinal” se for em diante o projecto dos arquitectos Frederico Valsassina e Manuel Aires Mateus para a esquina das ruas Alexandre Herculano e do Salitre, no Largo do Rato.
O historiador Rui Tavares, morador na freguesia da Graça, considera sobretudo que a maioria PS/BE está a ter uma “atitude pouco visível”. Reconhece que “há um grande torpedo na acção da Câmara que é a falta do empréstimo”, mas insiste que “está tudo lento de mais” na actuação do executivo. “O problema é que as coisas boas são coisas que não acontecem.
Entre o plano geral e o grande plano, há quem reconheça que a beleza de Lisboa se impõe afinal nas pequenas coisas.

Ver Lusa doc. nº 8518975, 07/07/2008 - 09:30

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