13/06/2009

‘Projecto Rua’ sem centro de emergência

Há cerca de um mês que o ‘Projecto Rua’ do Instituto de Apoio à Criança não tem um ‘porto seguro’ para acolher os menores que vagueiam pela capital. O centro foi afectado por um incêndio e tem sido difícil encontrar alternativas. E não tem sido fácil encontrar alternativas às instalações da Rua dos Douradores, que pertenciam à SCML.
Sem centro de emergência, o IAC, uma Instituição de Solidariedade Social criada em 1983 para a defesa da promoção dos direitos da criança, recorre a instituições parceiras e à equipa de emergência da SCML. Há apoio de retaguarda, mas falta, ao ‘Projecto Rua’, a segurança de ter uma resposta imediata quando é detectada uma criança em situação de risco.
A proximidade do Verão obriga a que não haja ‘folgas’ na procura, já que as estatísticas mostram que nesta época do ano sobem os casos de miúdos a vaguear pela cidade. “Há um empenho grande por parte da SCML. Esperamos soluções a curto prazo, mas não podemos, com a pressa, colocar em risco a qualidade da intervenção. Temos que ser exigentes”, explica a coordenadora do ‘Projecto Rua’, para quem os espaços até agora propostos “não são adequados”, dado que estes têm que ter “privacidade para os atendimentos”.
“Tomara que (o centro de emergência) não seja utilizado muitas vezes”. É contudo, um bom apoio quando a criança não está preparada para voltar ao contexto familiar ou para a instituição de onde fugiu. É ali que podem ‘esfriar’ as ideias, afastados de tentações que podem, num piscar de olhos, virar-lhes a vida do avesso.
A zona da Baixa aparece mais associada a casos de mendicidade, enquanto que o eixo da Avenida Almirante Reis e Intendente surge mais ligado a jovens que caem nas malhas da prostituição e da toxicodependência. Na Rua dos Douradores tinham a localização considerada ideal: estavam em plena Baixa, uma das zonas onde é encontrado maior número de menores a vaguear.
Estórias espalhadas pela capital são mais que muitas. Era também ali que se ganhava a confiança de quem anda sem rumo. Foi assim com uma adolescente de 14 anos, vinda de Leiria, que fugiu de casa na companhia do namorado mais velho e de índole duvidosa. Estava a um passo de cair na prostituição para se sustentar, a ela e ao namorado, quando foi encontrada a dormir nas arcadas do Terreiro do Paço.
Um dos últimos rapazes, com 17 anos, a utilizar o centro de emergência da Rua dos Douradores, na Baixa de Lisboa, ‘caiu na rua’ após uma discussão familiar. Uma equipa de rua encontrou-o a vaguear pela capital, com uma perna partida, na companhia de um cão. Apesar de estar na rua, gostava de estar sempre limpo e, encontrou no centro, um refúgio seguro e banhos diários. Não voltou a casa, mas, com a ajuda do IAC e da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, ganhou um projecto de vida. Agora estuda e trabalha.
No ano passado, foram detectadas 37 crianças em fuga nas ruas de Lisboa, mas apenas sete foram encaminhadas para instituições. É pelo modo como estão vestidos, pelo comportamento e na abordagem as equipas que se identificam muitos destes casos de risco.
Só nos primeiros cinco anos de funcionamento, o projecto do IAC (já com 20 anos de existência) retirou mais de seis centenas de crianças das ruas de Lisboa, fruto de denúncias e do trabalho das várias equipas que fazem ‘giros’ pela capital para identificar situações de risco. Agora o ‘Projecto Rua’ ficou, literalmente, na rua.

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