23/05/2007

Contratação de... dívidas

Para ocorrer a dificuldades de tesouraria que possam surgir no corrente ano financeiro, a CML pretendia, com a Proposta nº 125/2207, contrair dois empréstimos de curto prazo, num montante total de 30 milhões de Euros, junto de duas instituições bancárias, nos termos do art. 38º da Lei nº 2/2007. A Proposta vinha acompanhada por um “Mapa demonstrativo da capacidade de endividamento de curto prazo”, mas, em parágrafo algum ou qualquer rodapé da Proposta se descrimina ou sequer se alude ao destino a dar ao montante deste endividamento.
Ponderava-se a eventualidade de o empréstimo de 30 milhões servir para prover que os trabalhadores municipais recebessem o subsídio de férias, embora o próprio montante do empréstimo possa vir a não ser utilizado e a presidente da Comissão Administrativa acabasse por esclarecer que as verbas para salários e subsídios já estavam assegurados.
Então a que se destina esta ‘contratação de dívidas”?
Afirma-se que se tratava apenas de “contracção do empréstimo em conta caucionada”, de uma “uma medida cautelar”, ou seja, “uma garantia”, “uma espécie de salvaguarda”. A questão chave radica em que, embora o empréstimo possa ser “tecnicamente defensável”, a autarquia não deixa de ter um problema de liquidez para o qual o executivo deveria, atempadamente, ter apresentado um plano prévio de saneamento para combater essa situação. Aliás porque, por si só, o próprio pedido de empréstimo indicia a situação financeira em que a Câmara está.
E o que não se compreende nesta despesista gestão camarária é porque é que a maioria tenha alegremente cedido verbas para um rally até África, suportado custos com os Rock in Rio, não pressionando a BragaParques para compensar o município pelo uso indevido do estacionamento do Parque Mayer ou tenha aprovado isenções de taxas de milhões de euros ao Sporting e ao festival Creamfileds, ao mesmo tempo que propõe empréstimos de 30 milhões de euros para dificuldades de tesouraria!?
Mais: não existem sequer garantias para onde a verba se poderá ser destinada.
Só as dívidas de curto prazo a fornecedores ascendem a 177 milhões de euros. “Os orçamentos dos departamentos para este ano não chegam sequer para pagar as dívidas do ano passado”. Há um litígio entre a autarquia e os construtores porque a CML ainda não saldou as contas do Túnel do Marquês. A central de compras para material de escritório está emperrada. Faltam consumíveis. A limpeza urbana não dispõe de materiais, como, por exemplo, sacos de lixo para as zonas históricas. Falta dinheiro para lâmpadas, consumíveis eléctricos e manutenção dos cemitérios e dos espaços verdes. Há viaturas paradas por falta de peças, camiões do lixo sem condições para circular e veículos devolvidos por falta de pagamento do seu aluguer. Mais grave é o caso da manutenção da frota, que é de tal modo problemática que há nas oficinas um jogo de pneus novo para ir, à vez, com os carros à revisão. Quando voltam da inspecção, voltam a colocar-se-lhes as rodas antigas, com a eventual grave consequência da falta de segurança que tal facto acarreta.
E isto já para não falarmos dos salários nas administrações das SRUs e nas empresas municipais ou de vários projectos das Juntas de Freguesia da capital estarem paralisados por falta de liquidez, que as leva a esperarem pela transferência de cerca de 557,7 mil euros referente à comparticipação da componente de apoio à família, permitindo que as crianças do 1º ciclo do Ensino Básico possam ter acompanhamento no espaço escolar antes das 9 horas da manhã ou até às 19 horas.
O que os lisboetas sabem é que “pagam cada vez mais para receber cada vez menos da CML”. A autarquia gasta cada vez mais com o seu próprio financiamento e em troca fornece cada vez menos serviços aos seus munícipes. Este empréstimo é uma medida avulsa. Onde está um planeamento para o saneamento financeiro da CML?
Já por conta do orçamento de 2007, a CML “irá em 2007 pagar 95,5 mil euros por dia em juros relativos à dívida superior a mil milhões de euros. Os encargos com o passivo mais do que duplicam, registando uma subida de 148%” 1.
Porém ontem, na reunião da AML, houve quem voltasse a dar o benefício da dúvida e aprovasse mais um endividamento, um novo cheque em branco. Quem nos garante o destino que vai ser dado a mais estes 30 milhões de euros, que já não vai ser usado em salários de férias? Será que o lema é “o último a sair apaga as luzes” e “quem vier atrás que feche a porta do município”?

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