Aquando da discussão na AR de vários Projectos de Lei sobre o plano que define a rede nacional de ciclovias, as normas para velocípedes sem motor, o plano nacional de promoção da bicicleta e outros modos de transporte suaves, a promoção de redes de modos suaves a integrar nos planos de mobilidade urbana e os direitos dos ciclistas e peões no Código da Estrada, o deputado Francisco Madeira Lopes de “Os Verdes” prestou as seguintes declarações:
«O advento do automóvel e do motor de explosão por combustão mudou radicalmente o nosso mundo, o nosso espaço urbano, a nossa vida e o próprio Homem, a vários níveis.
Se, por um lado, teve inegáveis impactos positivos pela possibilidade que permitiu, a todos os níveis, o transporte de pessoas e bens, a verdade é que a sua generalização e expansão do uso que conheceu na segunda metade do século XX e que continua, hoje em dia, a acentuar-se revelam que tem um peso e custos elevadíssimos não só a nível ambiental mas também económico e social.
De facto, o crescimento exponencial do trânsito automóvel, agravado pela falta de investimento e de aposta que tem existido a nível dos transportes públicos colectivos, trouxe consigo problemas graves, tão variados como o congestionamento de trânsito, a sinistralidade rodoviária, o problema da saúde pública causado pela poluição, o stress ou a diminuição de exercício físico.
Além disso, condicionou o ordenamento viário e urbano, roubando tantas vezes espaço aos peões, e, provavelmente, o mais grave de tudo, constitui, hoje, um dos principais responsáveis pela dependência energética de que padecemos, pelas emissões de gases com efeito de estufa responsáveis pelas alterações climáticas e em boa parte - em cerca de um terço - pelo nosso não cumprimento dos compromissos do Protocolo do Quioto.
A verdade, é que existem alternativas para combater este problema, designadamente a aposta nos transportes públicos, mas também a aposta clara a nível da mobilidade suave. E, dentro da mobilidade suave, muito concretamente, a aposta no uso da bicicleta, porque esta pode ser uma alternativa ao automóvel com claras vantagens, designadamente em pequenos trajectos.
A bicicleta apresenta uma tecnologia relativamente barata e acessível na aquisição e na manutenção; é um meio democrático de transporte ao alcance de todos, de todas as idades, pois é fácil de usar; é silencioso, não polui, só consome as calorias do ciclista, contribuindo para a sua saúde; ajuda a reduzir o número de automóveis em meio urbano, melhorando-o mesmo, tornando-o mais seguro, saudável e humanizado.
Por outro lado, o cicloturismo, em crescente expansão, é uma forma sustentável de turismo com ganhos económicos apreciáveis. Aliás, a Alemanha calcula os seus ganhos anuais, a nível de cicloturismo, em cerca de 5 milhões de euros/ano. Portugal, por seu lado, é um grande produtor e exportador de bicicletas de qualidade.
Por iniciativa de “Os Verdes”, voltamos, mais uma vez, a discutir a importância da mobilidade suave, em geral, e o potencial da bicicleta, em concreto, em complementaridade com o pedestrianismo e os transportes públicos, para responder aos desafios energéticos, ambientais e de mobilidade do presente.
Depois de, em 2001, ter sido discutido, na AR, o nosso projecto de lei nº 67/VIII, que previa o plano da rede nacional de pistas dedicadas à circulação de velocípedes, hoje, voltamos a apresentar um projecto de lei para a criação de uma rede nacional de ciclovias, instrumento importantíssimo para garantir o direito dos ciclistas a pedalarem em segurança, separando-os, sempre que possível, do trânsito automóvel.
Todavia, não ficamos por aqui. Apresentamos, ainda, um projecto de lei para alteração do Código da Estrada, correspondendo ao apelo e propostas da ‘Plataforma para a Promoção do Uso da Bicicleta’ e procurando garantir os direitos dos ciclistas quando circulam na estrada, que não são um ‘veículo de 2ª’ e têm tanto direito como os automóveis.
Apresentamos também um projecto de resolução que visa a criação de um plano que permita a sensibilização e o incentivo do uso dos meios de mobilidade suave e, em concreto, da bicicleta no nosso País.
É por isso fundamental reconhecer que a bicicleta, para além de um meio de lazer, também pode ser um instrumento poderosíssimo ao nosso alcance para atingir os níveis ambientais e energéticos de que carecemos.
O que está em causa - e muitos cicloturistas e federações têm chamado a atenção para isto mesmo - é o facto de a bicicleta, ao contrário de outros veículos, não gozar da regra geral de prioridade face ao automóvel individual, o que a coloca em perigo em muitas situações de entroncamentos, de cruzamentos e de rotundas. Está provado, cientificamente, que esse facto conduz a acidentes!
Esta é uma questão que, certamente, poderemos aprofundar em sede de especialidade, mas acreditamos que ela é fundamental para garantir a segurança do ciclista, sem retirar espaço ao automóvel. Antes pelo contrário, compatibiliza-os como meios equiparados a nível da circulação viária.
Para encerrar o debate, quero notar que houve uma evolução positiva, desde o debate que tivemos em 2001 até hoje, relativamente a esta matéria, pois praticamente todas as bancadas reconhecem, agora, que esta matéria é profundamente importante, pelo que contamos com o apoio de todos para, na especialidade, discutir estas questões e resolver as dúvidas que possam existir».
Ler intervenção de Francisco Madeira Lopes, reunião plenária da AR de 2009-01-22