21/04/2009

Novos achados arqueológicos no Terreiro do Paço

Até que ponto a pressa do empreiteiro que está a fazer as obras de saneamento no Terreiro do Paço não poderá ter danificado, irreversivelmente, vestígios ali encontrados na semana passada?
A construtora “avançou com as máquinas sobre os vestígios sem autorização da tutela, estes já haviam sido registados [por desenho e fotografia] pelos arqueólogos que acompanham a obra”, esclarece o director do Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico (Igespar).
Entretanto, continua de pé uma escadaria em pedra, velha de vários séculos, que apareceu defronte do torreão poente da Praça do Comércio. Um poderoso anel metálico cravado a meio dos degraus atesta uma das suas funções - a amarração de barcos.

A escadaria estava enterrada e ninguém sabia da sua existência até as obras em curso a resgatarem ao passado. Irá agora ser desmontada para abrir caminho à passagem da conduta do esgoto, mas mais tarde ficará à vista de toda a gente, já que será remontada no lugar onde apareceu. À primeira vista parece fazer parte da amurada do Cais das Colunas. Os arqueólogos garantem que não, que poderá ser da época dos Descobrimentos.
Quanto aos achados destruídos pelo empreiteiro sem autorização do Igespar - restos de um cais de pedra prolongado por pontões de madeira assentes em estacaria -, o especialista em arqueologia náutica e subaquática fala da sua raridade, embora admita que a sua preservação seria impossível, uma vez que inviabilizaria a obra em curso. “Se estivesse numa conversa de café, diria que aquilo que se passou foi vandalismo”.
É que “antes de haver autorização do Instituto, não pode haver desmontagem”. Os arqueólogos chamam desmontagem à destruição de um vestígio quando ela é precedida do seu registo fotográfico ou desenhado. O dono da obra é a empresa intermunicipal Simtejo, mas episódios como este, puníveis por lei, não se podem repitir.
Para hoje, 3ª fª, está agendada uma reunião entre responsáveis da CML, do Igespar e das empresas envolvidas nas obras em curso na zona. Em cima da mesa estarão não só as questões relacionadas com a arqueologia como as dos prazos. O problema é que o presidente da CML prometeu que os transtornos que os trabalhos estão a criar aos lisboetas durariam apenas quatro meses, mas a necessidade de alterar alguns projectos para preservar os vestígios arqueológicos pode fazer com que as obras se prolonguem para lá de Junho.
E “por vezes a pressa é inimiga do património”, constata o director do Igespar.
Ainda na zona da Ribeira das Naus foi encontrado uma segunda estrutura de pedra, perpendicular ao rio e provavelmente da época anterior ao terramoto de 1755. O Igespar admite que possa vir a ter de ser atravessada pela conduta da água.
Muita da excitação dos arqueólogos com tudo o que estão a descobrir enterrado à beira-rio tem que ver com o facto de várias destas estruturas portuárias estarem representadas em antigos mapas e gravuras da cidade de Lisboa. Seriam imagens fiéis da metrópole portuária do século XVII? Ninguém sabia. Até hoje.
Por isso o director do Igespar apela à CML para que, terminadas as escavações, sejam divulgadas as descobertas feitas, “para que tudo o que está ali debaixo não fique nas gavetas dos peritos”.

3 comentários:

Anónimo disse...

ah grande antónio costa. Vai tudo á frente só para poder mostrar obra!! Quanto não vale o tacho

Guilherme Loureiro disse...

Sinceramente (e mesmo correndo o risco de ser crucificado por certas correntes bem pensantes desta Lisboa). Acho preferivel manter o curso das obras ao seu ritmo actual e optar por uma solução intermédia. Preservar o que é possível preservar--e até se possivel,expor estes achados logo após a obra concluida como é sugerido no texto--e.Avançar com as obras de modo a concluí-las dentro dos limites do prazo estipulado de modo a desbloquear aquela zona à circulação do trânsito automóvel o mais rapidamente possível.
Toda a zona ribeirinha de Lisboa constitui um eixo viário de escoamento fundamental em direcção à zona oriental da nossa cidade.
Fechar os olhos a esta realidade é ficar preso num passado muito diatante (que também deve ser encarado mas com algum realismo...) e não viver num presente, caractrizado por um caos absolutamente indesejável e que deverá ser resolvido mais curto espaço de tempo possivel...
De modo a descongestionar a nossa querida cidade de Lisboa.
Guilherme Loureiro

Joao disse...

Resta saber como seria a conversa se estivéssemos no século XVI e as escavações tivessem exposto vestígios arqueológicos do mítico porto de onde desatracou Ulisses depois de fundar a cidade. Destrói-se o passado para construir o futuro? Progresso vândalo ou saudosismo cultural? "Perguntem a Roma." seria a resposta mais simples.